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Direito à Desconexão é Tema Obrigatório nos Programas Corporativos de Saúde Mental

  • 20/04/2021
  • Carla Furtado, para Estadão

O áudio que chega depois do expediente, a notificação de uma mensagem em pleno fim de semana, o e-mail que aparece na madrugada e a reiterada sensação de morar no trabalho. Essa é a realidade de muitos brasileiros em atividade remota por força do isolamento físico imposto pela pandemia do Covid-19. Os recursos tecnológicos são fortes aliados para o cumprimento do distanciamento, mas a saída para a segurança física não significa necessariamente preservação da saúde mental. Ao contrário: pode contribuir para o adoecimento psíquico dependendo da dinâmica estabelecida.

Enquanto assistimos ao nascimento de programas de saúde mental em organizações privadas e públicas, cabe questionar: quais são as práticas adotadas em torno do direito do trabalhador à desconexão? É importante que as empresas interessadas em preservar um de seus maiores ativos, as pessoas, compreendam que para enfrentar os transtornos mentais e comportamentais é preciso ir além da oferta de terapia e meditação. É necessário mitigar os fatores que causam sofrimento.

Mesmo que os gestores afirmem não ser preciso responder fora do horário do expediente, muitos trabalhadores sentem-se obrigados a permanecer online para mostrar proatividade e até mesmo para manter o emprego. Ocorre que a liberdade de escolha sobre o que fazer com as horas de folga, geralmente dedicadas ao convívio social ou familiar, constitui uma necessidade psicológica. Além disso, a interrupção causada numa rápida leitura da mensagem é suficiente para provocar prejuízo no repouso e ainda se configurar em um fator estressor. Nunca é demais lembrar que boa parte das mensagens instantâneas é, em alguma escala, uma demanda.

É natural que estejamos confusos quanto aos limites do uso dos aplicativos de mensagens, visto que se instalaram com força total na rotina. Aparentemente, dependeremos desses recursos por muito mais tempo para o enfrentamento dos desafios impostos pela Covid-19. Contudo, em uma era de hiperconexão e em meio a uma pandemia, já aprendemos que preservar a saúde mental é uma questão de sustentabilidade humana e organizacional. Precisamos escolher entre sermos senhores ou servos das mensagens instantâneas, sob pena de perdermos o controle de nosso tempo. E tempo, à priori, é vida.


*Carla Furtado é pesquisadora científica e professora na área de psicologia e fundadora do Instituto Feliciência, com atuação no Brasil e em Portugal



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